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Como Calcular as Comissões dos Representantes Comerciais

  • Foto do escritor: Raquel Brum Pinheiro
    Raquel Brum Pinheiro
  • 5 de out.
  • 10 min de leitura

O cálculo das comissões é o coração da atividade de representação comercial. É através das comissões que o representante é remunerado pelo seu trabalho de prospecção, intermediação e fechamento de negócios. No entanto, uma prática infelizmente comum em muitas empresas é calcular as comissões de forma incorreta, deduzindo impostos, fretes e outros encargos do valor da venda. Essa conduta não apenas contraria a legislação vigente, como também prejudica diretamente os direitos do representante comercial e pode gerar sérias consequências jurídicas para a empresa representada.


A Base Legal: O Que Diz a Lei 4.886/65 sobre Como Calcular as Comissões dos Representantes Comerciais


A Lei 4.886/65, que regula as atividades dos representantes comerciais autônomos, é clara e objetiva ao estabelecer como devem ser calculadas as comissões. O artigo 32, §4º dispõe de forma inequívoca:


"As comissões deverão ser calculadas pelo valor total das mercadorias."


Não há margem para interpretações dúbias. A lei determina que a base de cálculo das comissões deve ser o valor total das mercadorias, ou seja, o valor bruto constante na nota fiscal, sem qualquer dedução de impostos, fretes, embalagens, seguros ou outros encargos.


Além disso, o caput do artigo 32 estabelece o momento em que nasce o direito à comissão:


"O representante comercial adquire o direito às comissões quando do pagamento dos pedidos ou propostas."


Isso significa que, uma vez confirmado o pagamento pela compra intermediada pelo representante, a comissão é devida integralmente, calculada sobre o valor total da operação.


O Entendimento Consolidado do Superior Tribunal de Justiça


A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), tribunal responsável pela uniformização da interpretação da legislação federal em todo o país, é firme e reiterada no sentido de que os impostos e demais encargos devem compor a base de cálculo das comissões.


REsp 1.162.985/RS - Decisão Paradigmática


No julgamento do REsp 1.162.985/RS, a Ministra Nancy Andrighi, relatora do caso, estabeleceu entendimento que se tornou referência para casos similares. Segundo a Ministra:


"A lei não faz distinção, para os fins de cálculo da comissão do representante, entre o preço líquido da mercadoria – excluídos os tributos – e aquele pelo qual a mercadoria é efetivamente vendida e que consta na nota fiscal."


A decisão deixa claro que o legislador, ao usar a expressão "valor total das mercadorias", quis se referir ao preço final pelo qual o produto é comercializado, incluindo todos os componentes que integram esse preço, especialmente os tributos.


REsp 756.115/MG - IPI Integra a Base de Cálculo


No REsp 756.115/MG, relatado pelo Ministro Raul Araújo, a Quarta Turma do STJ reforçou esse entendimento ao analisar especificamente a questão do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados):


"A melhor interpretação a ser conferida ao aludido dispositivo é no sentido de que a comissão deve ser calculada com base no preço da mercadoria no momento da venda intermediada pelo representante, o que corresponde ao valor total do produto até essa fase da comercialização."


O acórdão prossegue esclarecendo que, sendo o IPI um imposto indireto que integra a composição do preço da mercadoria e comporta repasse aos adquirentes, não pode ser abatido da base de cálculo da comissão devida ao representante.


AgInt nos EDcl no REsp 1.755.097/PR - Tributos e Frete


Em decisão mais recente, de dezembro de 2019, a Terceira Turma do STJ, também sob relatoria da Ministra Nancy Andrighi, consolidou que:


"O valor das mercadorias a que faz referência o art. 32, § 4º, da Lei 4.886/65 corresponde ao valor dos produtos no momento em que realizada a venda, considerando-se o preço lançado na nota fiscal, nele incluídos o valor dos tributos e qualquer outros que tenham constado da nota fiscal, como, eventualmente, o frete."


Essa decisão é especialmente importante porque deixa claro que não apenas os impostos, mas qualquer valor que conste na nota fiscal deve integrar a base de cálculo das comissões, incluindo frete, seguros, embalagens e outros encargos.


Por Que a Base Deve Ser o Valor Bruto?


A lógica por trás dessa regra legal e da interpretação jurisprudencial é bastante clara e reside na própria natureza da atividade de representação comercial.


A Comissão Reflete o Resultado da Intermediação


O representante comercial é remunerado pela intermediação de negócios mercantis. Seu trabalho consiste em prospectar clientes, apresentar produtos, negociar condições e fechar vendas. O resultado desse trabalho é medido pelo valor total da operação comercial que ele viabilizou.


Quando um representante negocia uma venda de R$ 100.000,00, ele está intermediando uma operação desse valor. O fato de que R$ 18.000,00 sejam destinados ao recolhimento de ICMS, ou que R$ 2.000,00 correspondam ao frete, não diminui em nada o mérito da intermediação realizada. O representante foi fundamental para viabilizar uma venda de R$ 100.000,00, não de R$ 80.000,00.


Os Tributos Fazem Parte do Preço


Os impostos que incidem sobre as operações comerciais (ICMS, IPI, ISS, PIS, COFINS) são tributos indiretos, ou seja, integram o preço final das mercadorias e são repassados ao consumidor. Eles não são custos adicionais externos à operação, mas componentes intrínsecos do preço de venda.


Quando um produto é vendido por R$ 100.000,00, esse é o preço da mercadoria, incluindo os tributos. Pretender excluir os tributos do cálculo da comissão seria como dizer que o representante intermediou uma venda de valor menor do que aquele efetivamente cobrado do cliente, o que não corresponde à realidade.


Proteção Legal do Representante


O legislador, consciente de que o representante comercial é a parte mais frágil na relação contratual com a empresa representada, estabeleceu normas protetivas claras. A vedação à dedução de impostos e encargos da base de cálculo das comissões é uma dessas proteções.


Sem essa regra, as empresas teriam margem para manipular o cálculo das comissões de diversas formas, reduzindo artificialmente a remuneração do representante através de descontos e deduções variadas.


Práticas Incorretas Comuns no Mercado


Apesar da clareza da legislação e da jurisprudência consolidada, muitas empresas ainda calculam as comissões de forma incorreta. Algumas das práticas ilegais mais comuns incluem:


1. Desconto de Impostos


A prática mais frequente é deduzir do valor da venda os tributos que incidem sobre a operação:

  • ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços)

  • IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados)

  • ISS (Imposto sobre Serviços)

  • PIS/COFINS (Programas de Integração Social e Contribuição para Financiamento da Seguridade Social)


Exemplo da Prática Incorreta:

  • Valor da venda: R$ 100.000,00

  • ICMS (18%): R$ 18.000,00

  • IPI (10%): R$ 10.000,00

  • Cálculo incorreto da comissão (5% sobre R$ 72.000,00): R$ 3.600,00

  • Cálculo correto da comissão (5% sobre R$ 100.000,00): R$ 5.000,00

  • Prejuízo ao representante: R$ 1.400,00 (28% a menos)


2. Desconto de Frete


Outra prática comum é excluir o valor do frete da base de cálculo, especialmente quando o frete está destacado na nota fiscal.


Exemplo:

  • Valor da mercadoria: R$ 50.000,00

  • Frete: R$ 3.000,00

  • Valor total da nota fiscal: R$ 53.000,00

  • Cálculo incorreto (5% sobre R$ 50.000,00): R$ 2.500,00

  • Cálculo correto (5% sobre R$ 53.000,00): R$ 2.650,00

  • Prejuízo: R$ 150,00


3. Desconto de Outros Encargos


Algumas empresas também deduzem:

  • Seguros

  • Embalagens especiais

  • Custos de montagem ou instalação

  • Despesas financeiras (juros de parcelamento)

  • Descontos comerciais concedidos ao cliente


Todas essas deduções são ilegais e contrariam o artigo 32, §4º da Lei 4.886/65.


4. Cláusulas Contratuais Abusivas


Há casos em que o próprio contrato de representação comercial estabelece que as comissões serão calculadas sobre o "valor líquido" das vendas, definindo que serão excluídos impostos e outros encargos.


Atenção: Essas cláusulas são nulas! Mesmo que o representante tenha assinado o contrato concordando com essa sistemática, a cláusula é considerada ilegal e abusiva, pois viola diretamente a Lei 4.886/65. A jurisprudência dos tribunais, inclusive do STJ, é firme em afastar a validade dessas disposições contratuais.


Como Deve Ser Feito o Cálculo Correto


O cálculo correto das comissões é simples e direto:


Comissão = Percentual Contratado × Valor Total da Nota Fiscal


Passo a Passo:


  1. Identifique o valor total da nota fiscal - Este é o valor que consta no campo "Valor Total da Nota" ou "Total da NF-e", que já inclui todos os impostos, frete e demais encargos.

  2. Aplique o percentual de comissão - Use o percentual estabelecido no contrato de representação comercial.

  3. Calcule o valor devido - Multiplique o valor total pelo percentual.


Exemplo Prático Completo:


Nota Fiscal de Venda:

  • Valor dos produtos: R$ 80.000,00

  • IPI (10%): R$ 8.000,00

  • Subtotal: R$ 88.000,00

  • ICMS (já incluído nos R$ 80.000,00): R$ 14.400,00

  • Frete: R$ 2.000,00

  • Seguro: R$ 500,00

  • Valor Total da NF-e: R$ 90.500,00


Cálculo da Comissão (5%):

  • R$ 90.500,00 × 5% = R$ 4.525,00


Não importa como os valores estão discriminados na nota fiscal. O que importa é o valor total final, aquele que o cliente efetivamente pagará.


O Que Fazer Se Suas Comissões Estão Sendo Calculadas Incorretamente


Se você é representante comercial e identificou que suas comissões estão sendo calculadas sobre o valor líquido, com deduções indevidas de impostos, frete ou outros encargos, você tem direitos garantidos por lei.


1. Notifique Formalmente a Representada


O primeiro passo é comunicar oficialmente a empresa sobre o erro no cálculo. Faça isso por escrito (e-mail, carta ou notificação extrajudicial), mencionando:


  • A previsão legal (art. 32, §4º da Lei 4.886/65)

  • A jurisprudência do STJ

  • O cálculo correto que deveria ter sido aplicado

  • As diferenças não pagas

  • O pedido de regularização imediata


Essa notificação é importante por dois motivos: (a) pode resolver o problema amigavelmente; e (b) serve como prova de que você não ficou inerte diante da violação, evitando a aplicação da teoria da supressio (perda de direito pela inércia prolongada).


2. Calcule as Diferenças Devidas


Levante todas as comissões que foram pagas nos últimos anos (respeitando o prazo prescricional de 5 anos) e refaça os cálculos usando a base correta (valor total da nota fiscal). A diferença entre o que foi pago e o que deveria ter sido pago é o seu crédito.

Não se esqueça de aplicar correção monetária e juros sobre esses valores.


3. Considere a Rescisão por Justa Causa


O cálculo incorreto sistemático e reiterado das comissões, com dedução indevida de valores, pode configurar descumprimento contratual grave pela representada. Isso pode justificar a rescisão do contrato por justa causa pelo representante, com direito a receber todas as verbas rescisórias:


  • Comissões em atraso (calculadas corretamente)

  • Indenização por clientela (1/12 avos - art. 27, "j" da Lei 4.886/65)

  • Aviso prévio

  • Qualquer outra verba prevista em contrato ou em lei


A rescisão por justa causa com base nesse fundamento tem amparo legal e jurisprudencial. A violação reiterada do artigo 32, §4º é considerada motivo suficiente para que o representante rompa o contrato imputando a culpa à representada.


4. Busque Assessoria Jurídica Especializada


Questões envolvendo cálculo de comissões, diferenças a receber e rescisão contratual são complexas e exigem conhecimento técnico específico. Um advogado especializado em direito empresarial e representação comercial poderá:


  • Revisar seu contrato e identificar todas as irregularidades

  • Calcular com precisão as diferenças de comissões devidas

  • Avaliar se há fundamento para rescisão por justa causa

  • Conduzir negociações com a representada

  • Propor ação judicial de cobrança, se necessário

  • Garantir que seus direitos sejam integralmente respeitados


5. Ação Judicial de Cobrança


Se a representada se recusar a regularizar o pagamento das comissões calculadas corretamente, o representante pode ajuizar ação judicial de cobrança para buscar:


  • Pagamento das diferenças de comissões (com correção e juros)

  • Eventuais verbas rescisórias (se optar pela rescisão)

  • Honorários advocatícios


A jurisprudência consolidada do STJ é extremamente favorável ao representante nesses casos. Os tribunais têm condenado reiteradamente as empresas que calculam comissões sobre valores líquidos, determinando o pagamento das diferenças e, em muitos casos, reconhecendo a justa causa para rescisão.


Riscos para a Empresa Representada


Para as empresas representadas, calcular comissões de forma incorreta não é apenas uma ilegalidade, mas também uma bomba-relógio que pode gerar consequências financeiras graves:


1. Pagamento Retroativo de Diferenças

A empresa pode ser condenada judicialmente a pagar todas as diferenças de comissões dos últimos 5 anos (prazo prescricional), com correção monetária e juros. Dependendo do volume de vendas e do número de representantes afetados, isso pode significar valores muito significativos.


2. Rescisão por Justa Causa com Verbas Rescisórias

Se o representante optar por rescindir o contrato alegando justa causa com base no cálculo incorreto das comissões, a empresa terá que pagar todas as verbas rescisórias, incluindo a indenização de 1/12 avos, que pode ser bastante expressiva dependendo do tempo de contrato e do volume de comissões.


3. Honorários Advocatícios de Sucumbência

Em ações judiciais, a parte perdedora é condenada a pagar os honorários advocatícios da parte vencedora. Como a jurisprudência é consolidada a favor dos representantes, a probabilidade de a empresa ser condenada é alta, o que significa custos adicionais com honorários.


4. Risco Reputacional

Empresas conhecidas por não respeitarem os direitos de seus representantes comerciais têm dificuldade para atrair e manter bons profissionais. A reputação negativa no mercado pode prejudicar seriamente os negócios.


5. Fiscalização dos Conselhos Regionais

Os Conselhos Regionais dos Representantes Comerciais (COREs) podem fiscalizar os contratos e as práticas das empresas. Irregularidades podem gerar denúncias e complicações administrativas adicionais.


Boas Práticas para Empresas Representadas


Para evitar problemas jurídicos e manter relações saudáveis com seus representantes comerciais, as empresas devem:


  1. Calcular comissões sobre o valor total da nota fiscal, sem qualquer dedução

  2. Revisar contratos antigos que contenham cláusulas de cálculo sobre valor líquido

  3. Treinar equipes de recursos humanos e financeiro sobre a forma correta de cálculo

  4. Ser transparente com os representantes, fornecendo relatórios detalhados de comissões

  5. Buscar assessoria jurídica para adequação de contratos e processos internos


Conclusão


Como Calcular as Comissões dos Representantes Comerciais: O cálculo correto das comissões do representante comercial não é uma questão de escolha ou de interpretação. A legislação é clara, a jurisprudência é consolidada e o entendimento é pacífico: as comissões devem ser calculadas sobre o valor total das mercadorias, conforme consta na nota fiscal, incluindo todos os impostos, frete e demais encargos.


Qualquer dedução desses valores configura violação à Lei 4.886/65 e pode gerar consequências sérias para a empresa representada, incluindo pagamento retroativo de diferenças, verbas rescisórias por justa causa e condenações judiciais.


Se você é representante comercial e suas comissões estão sendo calculadas incorretamente, não fique inerte. Notifique a representada, calcule suas diferenças e, se necessário, busque seus direitos judicialmente. A lei e a jurisprudência estão ao seu lado.


Se você é empresa representada, revise urgentemente seus procedimentos de cálculo de comissões e adeque-os à legislação e à jurisprudência. Isso evitará problemas futuros e demonstrará respeito pelos profissionais que representam sua marca no mercado.


A relação entre representante e representada deve ser pautada pela transparência, pelo respeito mútuo e pelo cumprimento rigoroso da lei. O cálculo correto das comissões é um pilar fundamental dessa relação equilibrada.


Suas comissões estão sendo calculadas incorretamente? Entre em contato conosco para uma análise detalhada do seu contrato, cálculo das diferenças devidas e orientação sobre as melhores estratégias para garantir seus direitos. Nossa equipe é especializada em direito de representação comercial e está pronta para ajudá-lo.


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